reino fungi

habita-me um fungo. a minha unha do pé pertence doravante ao reino fungi.
como me aconteceu não sei. mas suponho que esta colónia oportunista vai resistir ferozmente à guerrilha que lhe montei. entretanto não me sentirei tão só.
consulto a informação disponível em rede. lembro matéria que há muito esqueci nos bancos do liceu. as hifas, os esporos, os micélios. todo um admirável mundo discreto que ora nos regala o paladar ora nos atormenta de comichão as virilhas. os fungos mais os vírus e as bactérias são bons companheiros. vivem connosco há milhares de anos e possivelmente herdarão a terra. como as baratas, essas crocantes fugidias. uma coisa é certa: os fungos trabalharão afincadamente na nossa remoção. o planeta é um vastíssimo ecoponto.
a minha onicomicose, digo isto sem vaidade, é das mais resistentes paródias de fungos. a unha perdeu a cor, aumentou de espessura e um filão quase marfim atravessa-a longitudinalmente. há aqui um abstraccionismo inesperado. monocromático. há talento a meus pés.
comprei para os devidos efeitos um antifúngico, meio quartilho de acetona e pó branco para o interior dos sapatos. tudo legal e sem comparticipação. o estado assobia para o lado quando se trata de fungos e outros parasitas.
o verniz medicamentoso entrega-se num odor forte e eficaz. domina a hora de deitar. é pena ser transparente. é pena as cores da moda ainda não chegarem tão baixo.
preparo um novo morticínio. desarrolho o frasco e encharco generosamente o pequeno pincel. debruço-me qual gulliver sobre uma lilliput aterrorizada. espalho o verniz com devoção e a língua de fora. não farei prisioneiros. ai dos vencidos.

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